Com MPRJ, Força-Tarefa realiza Operação Purificação e prende 70 pessoas
Depois de um ano de investigações de uma Força-Tarefa formada pela Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública (SSINTE), pela Polícia Federal, pela Coordenadoria de Inteligência da Polícia Militar (CI/PMERJ) e pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro foi desencadeada, às 6h desta terça-feira (04/12), a Operação Purificação, para cumprir 83 mandados de prisão, sendo 65 de policiais militares e 18 de traficantes. Os PMs – à época lotados no 15º BPM (Duque de Caxias) –, de acordo com investigações, recebiam propina dos bandidos para não coibir atividades criminosas em 13 favelas de Caxias dominadas pela facção Comando Vermelho. Até o início da tarde, haviam sido presos 59 PMs e 11 traficantes.
O GAECO denunciou os acusados pelos crimes de formação de quadrilha armada, tráfico de drogas, associação para o tráfico, corrupção ativa, corrupção passiva e extorsão mediante sequestro. Foram cumpridos 112 mandados de busca e apreensão na casa dos denunciados e em batalhões da PM.
Em entrevista coletiva na sede do Quartel General da PM, o coordenador do GAECO, Promotor de Justiça Claudio Varela, ressaltou que a criação da Força-Tarefa foi essencial para o sucesso da operação. “Foi muito importante todos os órgãos unidos no combate à corrupção. Sem isso não seria possível levar adiante este trabalho. Os maus policiais não podem manchar a imagem de uma instituição”, afirmou Varela.
O Secretário de Estado de Segurança, José Mariano Beltrame, destacou e agradeceu a parceria entre as polícias e o Ministério Público na Operação Purificação. “Não temos como resolver o problema da segurança pública sem parcerias. Nosso problema é do bem contra o mal. Esses PMs serão expulsos da corporação”, disse Beltrame.
A denúncia do GAECO relata que os policiais militares não se limitavam a receber “arrego” para deixar de reprimir o tráfico. As apurações revelaram que os PMs também sequestravam bandidos e seus familiares, apreendiam veículos da quadrilha de traficantes, exigindo dinheiro para devolução, negociavam armas e realizavam operações oficiais quando o pagamento da propina atrasava. O principal alvo dos policiais era a favela Vai Quem Quer, mas agiam também nas comunidades Beira-Mar; Santuário; Santa Clara; Centenário; Parada Angélica; Jardim Gramacho; Jardim Primavera; Corte Oito; Vila Real; Vila Operário; Parque das Missões e Complexo da Mangueirinha. De acordo com investigações da SSINTE, PF e CI/PMERJ, os policiais militares não tinham um comando único e dividiam-se em 11 células autônomas.
O Comandante-Geral da PM, Coronel Erir Ribeiro Costa Filho, disse que a sociedade e a instituição não aceitam mais PMs corruptos. “Eles precisam entender que isso acabou. Não aceitamos mais sermos humilhados por desvios de conduta. Agradeço também a parceria do GAECO e da PF, fundamental para o trabalho dar certo”, afirmou.
No núcleo do tráfico, Carlos Braz Vitor da Silva, o “Paizão” ou “Fiote”, é chefe do Comando Vermelho nas favelas de Caxias e, de acordo com investigações, mesmo preso na Penitenciária Vicente Piragibe, no Complexo de Bangu, mantém frequentes contatos telefônicos com seus “subordinados” e continua dando ordens e recebendo informações detalhadas sobre a rotina da atividade criminosa nas comunidades, decidindo inclusive sobre os valores a serem pagos no “arrego”. A denúncia relata que um dos seus homens de confiança é Willian da Silva, “Pit” ou “Cabeça”, elemento de ligação entre a quadrilha e os policiais militares da região, sendo o responsável pelo pagamento das propinas e também da negociação do resgate de homens do bando sequestrados por policiais, assim como a liberação dos carros apreendidos ilegalmente.
O delegado Fabio Andrade, da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da PF, disse que a sociedade do Rio de Janeiro saiu vitoriosa. “Que a operação tenha efeito inibidor naqueles que insistem em não seguir as regras. Não há mais tolerância para policiais corruptos”, afirmou.
A quadrilha de “Fiote”, segundo a SSINTE, PF e CI/PMERJ e GAECO, além de manter parceria com o tráfico de drogas no Complexo do Lins, Parque União e Favela Nova Holanda, que também foram alvo da Operação Purificação, estendeu seus domínios para fora do Estado do Rio, estabelecendo relações com traficantes do Mato Grosso do Sul, de onde vem parte das drogas vendidas nas favelas de Duque de Caxias.
Outras peças importantes no bando de “Fiote”, de acordo com investigações, são Valdirene Faria Barros, vulgo “Val”, que atua intermediando pagamentos a equipes de policiais em extorsões sofridas por integrantes dos bandos, e Lemuel Santos de Santana, vulgo “Doutor”, que tem a função de contratar advogados para defender traficantes presos e orientar a quadrilha na relação com PMs corruptos. As investigações da SSINTE, PF, CI/PMERJ e GAECO apontam que o preço da propina flutuava de acordo com a capacidade de venda de drogas pelos bandidos.
Durante as investigações da Força-Tarefa, foi possível constatar que os policiais militares conheciam bem os bandidos. Foragido da Justiça, Jeferson Ferreira Abrantes, o “Nando” ou “Sorriso”, que atuava no abastecimento das bocas de fumo da comunidade Vai Quem Quer, era alvo constante de extorsões dos PMs, que exigiam pagamento de valores em dinheiro para a manutenção da sua liberdade. Em uma das conversas gravadas com autorização judicial, em abril deste ano, o denunciado Willian da Silva conta para homem não identificado que “Jeferson havia sido detido por seus tios (policiais militares)”. Pouco tempo depois, em nova ligação, Willian afirma que “policiais que faziam uso de viatura modelo Renault teriam extorquido R$ 1,5 mil de Jeferson”.
Foi descoberto ainda que, na tentativa de ocultar os seus nomes, os policiais militares criaram apelidos coletivos para as equipes. “Martelo”; “Rio do Ouro”; “Bonde do Chininha”; “Bonde do King Kong”; “Macumba” e “Munição” eram alguns dos codinomes. Para facilitar a comunicação traficantes e PMs também montaram um “dicionário próprio”: “Sintonia” (expressão usada pelos traficantes e policiais para definir o acordo de não interferência nas atividades ilícitas), barcas (Patamos); guerra (repressão ao tráfico de drogas e entorpecentes); “pequenos” (viaturas da marca Logan), entre outros.
Os policiais militares também demonstravam ousadia na hora de negociar armas. Segundo investigações da SSINTE, PF e CI/PMERJ e GAECO, em junho deste ano, o mesmo PM Vagner esconde dentro de uma geladeira de um barraco uma carabina calibre 12, para ser pega por um traficante. Além disso, deixou R$ 300 dentro do congelador como parte de um pagamento. Os policiais também usavam as dependências de Destacamento de Policiamento Ostensivo para cometer crimes, apontaram as investigações. Em maio deste ano, de acordo com o GAECO, os PMs Jorge Sebastião da Silva Lucio, Alex Ayala Batista de Azevedo, André Luis Fernandes da Costa, Farias, Edson Manfigeste da Silva, João Batista Braga Júnior e Cesar Silva Macedo prenderam um traficante e o levaram para o DPO de Jardim Primavera, de onde começaram a “negociar” sua liberação, exigindo R$ 5 mil e indicando que o DPO seria o local de pagamento.
Os mandados de prisão e de busca e apreensão foram expedidos pela Juíza Daniela Barbosa Assumpção de Souza, da 2ª Vara Criminal de Duque de Caxias. O GAECO também requereu à Justiça o bloqueio integral do dinheiro nas contas correntes de dois denunciados.
Participaram da entrevista coletiva o Subsecretário de Inteligência da Secretaria de Estado de Segurança, Fábio Galvão; o Superintendente da Polícia Federal, delegado Valmir Lemos de Oliveira e o chefe da Coordenadoria de Inteligência da Polícia Militar, Tenente-Coronel Jorge Goulart.