SANTA CATARINA – Em seminário sobre crime organizado, Ministro Barroso defende descriminalização do uso da maconha
O Ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrou o seminário “Desafios do sistema de justiça frente ao crime organizado” com uma palestra sobre o crime organizado e sobre o papel do STF no combate a essa prática. O evento, que ocorreu durante toda a segunda-feira (25/6) no auditório do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), foi uma promoção conjunta do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), do TJSC e da Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC).
Com base em estatísticas, o Ministro demonstrou para um auditório lotado que o narcotráfico, a falsificação de produtos e o tráfico humano são os crimes mais rentáveis no mundo. Já no Brasil, as três modalidades de crimes mais praticadas são o narcotráfico, o contrabando de armas e a corrupção.
“Somos um dos países mais violentos do mundo, com uma média de 30,3 homicídios por 100 mil habitantes, enquanto a média mundial é de 10 homicídios por 100 mil habitantes. Essa taxa vem caindo nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste e vem aumentando de maneira exponencial nas regiões Norte e Nordeste”, afirmou.
Na região Norte, a mais violenta do país, há 44,5 mortes por 100 mil habitantes. O crime organizado é o principal suspeito dessa estatística. “As principais organizações criminosas do país passaram a disputar territórios nas regiões Nordeste e Norte, que passaram a criar suas próprias e novas facções. O ‘caldo’ de cultura que produz toda essa violência é composto por drogas, armas e corrupção”, complementou.
Como forma de combater esse cenário, Barroso defendeu, durante a palestra, a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O Ministro lembrou que o tema vem sendo discutido no STF. Já há três votos pela descriminalização do uso da maconha, um dos quais é do próprio Ministro Barroso. Segundo ele, mais importante que a descriminalização do porte da maconha é a criação de um critério objetivo para diferenciar tráfico de consumo pessoal.
No mundo real, afirmou o Ministro, dependendo do local em que se dá a prisão, as mesmas quantidades de drogas podem ser enquadradas de maneiras diferentes. “No caso do Rio de Janeiro, geralmente na Zona Sul é porte para uso pessoal, e no Rebouças a mesma quantidade é considerada tráfico”.
Para Barroso, o Brasil tem que discutir o problema das drogas abertamente, sem preconceito. “O que vem sendo feito não está funcionando. A guerra contra as drogas fracassou no mundo inteiro. Temos que quebrar o poder do tráfico. As drogas ilícitas são uma coisa ruim. Portanto, o papel do Estado é desincentivar o consumo, tratar os dependentes e combater o tráfico”, ressaltou.
No limiar entre a velha ordem e a nova ordem
Embora reconheça que o Brasil vive um momento difícil e até mesmo sombrio, Barroso se diz um otimista moderado. “Creio que o país vive um momento sombrio, mas, ao mesmo tempo, no limiar entre a velha e a nova ordem. Constato, ao mesmo tempo, ao percorrer esse imenso país, uma grande demanda por integridade, e isso é altamente positivo”.
Para Barroso, o Brasil registrou nos últimos tempos mudanças de atitudes, de leis e de jurisprudência que passaram um recado claro à sociedade e começaram a desfazer a crença de que o crime compensa. “Inicialmente a Ação Penal 470 e, mais recentemente, a Operação Lava Jato, com prisões e condenações aos autores de crimes do colarinho branco, verdadeiros corruptores seriais, marcaram essa passagem e apontam para um futuro em que a elite extrativista deste país, que só sobrevive em meio à corrupção, terá que repensar esse modelo de capitalismo de compadrio”, declarou.
Ao final da palestra, Barroso fez questão de afirmar que os brasileiros estão plantando sementes para um futuro novo, para a refundação do Brasil. “A única coisa que as pessoas não podem fazer é desistir ou deixar de fazer bem a sua parte porque os outros não estão fazendo. Não importa o que esteja acontecendo a sua volta; faça o melhor papel que puder”, finalizou.
Atuação solidária e compartilhada
Para o Procurador-Geral de Justiça, Sandro José Neis, que presidiu a mesa de encerramento do evento, o Ministério Público e o Tribunal de Justiça de Santa Catarina demonstraram disposição ao diálogo e a uma atuação solidária e compartilhada, com propósitos comuns. “Vivemos momentos de transformação que exigem sacrifícios e superações. Mas mesmo com um preço a se pagar, me parece que o saldo é positivo. Acredito também, como otimista que sou, que teremos dias melhores”.
O evento ainda contou com palestras do Promotor Sérgio Bruno Fernandes (MPDFT) e do Ministro Rogerio Schietti Cruz (STJ), que aproveitou a oportunidade para promover o lançamento de sua obra “Prisão cautelar: dramas, princípios e alternativas”, e do Juiz Federal Sérgio Moro. O seminário foi voltado a servidores (que atuam como assessores na área criminal) e magistrados do TJ, membros do MPSC, magistrados federais, Procuradores da República e alunos da Esmesc e da Escola do MPSC.
Como se previa, as 600 vagas disponibilizadas foram preenchidas e o auditório do TJ esteve lotado ao longo de toda a programação. Ao final do evento, a equipe de Comunicação Social do MPSC, em parceria com a assessoria de comunicação do TJSC, entrevistou o Ministro. Assista aos vídeos abaixo.